Pesquisa experimental
A pesquisa experimental é um método, uma lógica interna, aplicada ao desenho de pesquisa que foi desenvolvida por Karl Popper, a partir dos critérios de falseabilidade ou falsificacionismo e verificabilidade. O método hipotético-dedutivo, portanto, toma parte da estrutura de construção do conhecimento.
São desenvolvidos modelos experimentais para delinear a pesquisa, “definidos como a materialização de uma parte da realidade, por meio da representação simples de uma ocorrência recente ou antiga” (FERREIRA; HOCHMAN; BARBOSA, 2005).
A elaboração desses modelos experimentais auxilia tanto na construção de um conhecimento mais próximo da realidade, como na construção e análise de outros modelos experimentais (FERREIRA; HOCHMAN; BARBOSA, 2005).
A manipulação é a principal característica da pesquisa experimental, em uma tentativa deliberada de produzir efeitos, pesquisadores e pesquisadoras delineiam grupos de indivíduos (sujeitos de pesquisa) para testar suas hipóteses através da observação das variáveis.
As variáveis independentes (efeitos) e dependentes (causa) são observadas no processo, que é diferente quando tratamos de pesquisa em laboratórios ou pesquisa de campo, por exemplo (RAUPP; BEUREN, 2006). O fator determinante é o delineamento da pesquisa.
Em laboratório é criado um cenário que pode ser controlado pela pessoa que pesquisa, manipulando as variáveis, observando o efeito dessa manipulação. Em estudos de vacinas, a candidata a vacina é aplicada em um conjunto de patógenos e o resultado dessa aplicação é comparado ao mesmo patógeno, no mesmo ambiente controlado, que não recebeu a aplicação. A diferença, por comparação, fornece os dados necessários para se testar a hipótese de que uma vacina é ou não uma candidata viável.
Uma das condições para a pesquisa experimental é a aleatoriedade, em que todos sujeito de pesquisa (seja uma pessoa ou uma placa de petri) tem a mesma probabilidade de ser escolhida como amostra no delineamento dos grupos do experimento (RAUPP; BEUREN, 2006). Logo, ao menos dois grupos devem ser estudados e comparados, para que possamos saber a relação com às variáveis a partir da manipulação.
As condições de delineamento de pesquisa experimental envolvem o desenvolvimento de um ambiente controlado mais próximo possível do natural (FERREIRA; HOCHMAN; BARBOSA, 2005).
Por exemplo, se desejamos saber a efetividade de uma política de segurança alimentar nas escolas públicas de um determinando município, em um primeiro cenário de delineamento de pesquisa, sorteamos de forma aleatória uma amostra das escolas. Nessa amostra devem conter um número significativo de estudantes que participam e que não participam da política de segurança alimentar. São escolhidas as variáveis a serem analisadas com base na literatura, que são influenciadas por hábitos alimentares. Índice de massa corpórea, quantidade de gorduras no sangue (colesterol HDL e LDL), massa muscular, capacidade de oxigenação, todas essas e mais, podem ser variáveis escolhidas. Se delimita um tempo de acordo com a literatura para que a política de segurança alimentar possa ter efeito. Então, após esse prazo, são coletados os dados e comparados entre os dois grupos.
Não obstante, esse exemplo simples de delineamento da pesquisa experimental pode ocasionar uma série de vieses de pesquisa que influenciam o resultado.
A amostra contém pessoas de diferentes faixas etárias, genótipos, com diferentes hábitos alimentares fora da escola, que praticam ou não exercícios, e muitas outras variáveis que não estão sob o controle de pesquisadores e pesquisadoras e afetam, diretamente o experimento, são as chamadas variáveis espúrias. Para melhor delinear a pesquisa, critérios como idade, renda familiar, hábitos desportivos e gênero, por exemplo, podem ser observados na composição desses grupos de amostra, tornando a comparação entre os grupos mais próxima da realidade.
A esse processo, de conduzir a lógica interna da pesquisa, chamamos de delineamento da pesquisa. Em pesquisa experimental, pensar as variáveis, o ambiente, a amostra e sua aleatoriedade, são fatores determinantes para a condução do experimento.
Na pesquisa experimental você tem um grupo controle, que sofre o mínimo possível de manipulação, e um ou mais grupos de amostra, que serão manipulados e terão suas variáveis comparadas entre si e com o grupo controle. A comparação para o teste de hipótese (falseamento) conduz a construção da teoria (verificabilidade), sendo corroborada na medida em que uma nova teoria, que responda melhor à pergunta de pesquisa, não substitua a teoria atual.
O delineamento da pesquisa experimental é o fator determinante para a construção do conhecimento, uma vez que o tamanho da amostra e a forma de seleção, as variáveis independentes e as variáveis dependentes, fornecem as bases para a coleta e análise de dados.
Tamanho de amostra e sua seleção representam o todo a ser estudado. Uma amostra probabilística randomizada, com critérios de inclusão e exclusão bem delimitados, favorecem que essa representação seja o mais aleatória possível,
A maior parte dos testes bioestatísticos pressupõe que a amostra estudada seja probabilisticamente representativa da população. Algumas amostras coletadas por conveniência, como a escolha de pacientes consecutivos de um ambulatório específico, podem não representar adequadamente toda a população do estudo. O pesquisador [e/ou a pesquisadora] deve estar atento [atenta] a possíveis vieses de seleção oriundos da disponibilidade de pacientes em amostragens consecutivas, já que a ampliação do tamanho amostral não corrige o efeito de amostras enviesadas. Além disso, estratégias de amostragens estratificadas não probabilísticas, por quotas, complexas (conglomerados, multiníveis), por resposta voluntária, por saturação de variáveis, tipo “bola de neve” ou com sistemática de coleta não aleatorizada devem ser desenhadas, dimensionadas e analisadas com suporte de estatístico [e/ou estatística] experiente (MIOT, 2011, p. 275).
Caso seja necessário, um pré-teste, com uma amostra entre 30 e 50 pessoas pode ser observada no sentido de compreender se o grupo em questão atende aos requisitos para contribuir com a pergunta de pesquisa estipulada (MIOT, 2011, p. 275).
As variáveis devem ser igualmente pensada, para que possamos estabelecer relações de causa e efeito, a partir da manipulação desse ambiente controlado durante o processo de pesquisa. As variáveis independentes (efeitos) são aquelas que você vai manipular e que acredita (tem uma hipótese) que causam algum efeito a ser comparado entre o grupo experimental e o grupo controle, gerando as variáveis dependentes (causa) (RANGA et. al, 2014).
Se eu tenho um grupo de 100 pessoas, dividido em dois grupos de 50 pessoas, e alimento um dos grupos estritamente com alimentos que contém gordura saturada (variável independente), acredito que com o passar do tempo, essas pessoas vão apresentar índices maiores de colesterol LDL. Para isso, digamos que esse experimento seja conduzido 3 vezes por semana durante 6 meses. Então eu comparo os dados do grupo controle e do grupo experimental, buscando saber se o efeito proporcionado pelo experimento fornece uma causa para que possa afirmar se o consumo de alimentos com gordura saturada no período de 6 meses, consumido 3 vezes por semana, aumenta em média X o valor do colesterol LDL. Em um processo de falseamento da hipótese.
No tocante as variáveis, como já discutido, as variáveis espúrias, aquelas que admitem correlação, mas que, na realidade, não se relacionam de forma lógica com o experimento, devem ser mitigadas no desenho de pesquisa para que não venham a interferir nos resultados de pesquisa. O pré-teste é um instrumento que ajuda a compreender essas variáveis aplicadas a grupos maiores, bem como uma boa revisão de literatura acerca do assunto pode ser de grande valia (RANGA et. al, 2014).
Um exemplo clássico é a correlação entre vítimas de afogamento e filmes no Nicholas Cage, é logicamente improvável que os filmes do Nicholas Cage (VIGEN, 2023), por mais questionáveis que sejam, causem afogamento. No entanto, essa relação apresenta uma correlação forte na análise, similar ao número de divórcios no estado do Maine (USA) e o consumo de margarina estadunidense que tem correção de 99,26% (VIGEN, 2023). Correlação não implica em causalidade, e como os dados da pesquisa experimental, normalmente são analisados a partir de estatística inferencial, testes de correlação são muito comuns e notadamente afetados por correlações espúrias advindas de variáveis espúrias.
Nesse sentido, para boas práticas da pesquisa experimental, a seleção de amostra, sua aleatoriedade, o controle das variáveis e a análise crítica dessas variáveis e de seus resultados são fatores importantes para o desenvolvimento de pesquisas com maior qualidade e rigor.
Referências
FERREIRA, Lydia Masako; HOCHMAN, Bernardo; BARBOSA, Marcus Vinícius Jardini. Modelos experimentais em pesquisa. Acta Cirurgica Brasileira, [S.L.], v. 20, n. 2, p. 28-34, 2005. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s0102-86502005000800008.
MIOT, Hélio Amante. Tamanho da amostra em estudos clínicos e experimentais. Jornal Vascular Brasileiro, [S.L.], v. 10, n. 4, p. 275-278, dez. 2011. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1677-54492011000400001.
RANGA, Sonam; JAIMINI, Manish; SHARMA, Sanjay Kumar; CHAUHAN, Bhupendra Singh; KUMAR, Amit. A Review on Design OF Experiments (DOE). INTERNATIONAL JOURNAL OF PHARMACEUTICAL AND CHEMICAL SCIENCES, (S.L.), v. 3, n. 1, jan-mar., 2014.
RAUPP, Fabiano Maury; BEUREN, Ilse Maria. Metodologia da pesquisa aplicável às ciências. In: RAUPP, Fabiano Maury; BEUREN, Ilse Maria. Como elaborar trabalhos monográficos em contabilidade: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2006.
VIGEN, Tlyler. Spurious correlations.[2023] Disponível em: https://www.tylervigen.com/spurious-correlations acesso: 29 jun. 2023.
Vídeo
Esse conteúdo é parte das ações de formação de cientistas do Mestrado Profissional em Educação da Universidade Regional do Cariri (MPEDU/URCA) do Ceará (CE). Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e a Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – Funcap por financiarem esse produto educacional.
Como citar:
(ANTUNES; TORRES, 2023)
Como referenciar:
ANTUNES, Jeferson; TORRES, Cicero Magerbio Gomes. Formação científica. In: Pesquisa experimental. Formação científica. Crato, 27 jun. 2023. Disponível em https://formacaocientifica.com.br/?p=138. Acesso em: dd mm ano.

Pós-doutorando em educação (MPEDU), Doutor em Educação (UFC), Mestre em Desenvolvimento Regional sustentável (UFCA), Licenciado em História (URCA).